#45: Na companhia da Lua
Ainda me julgo mimada quando penso: puxa, esses dias não tive um momento pra mim. Como se essa escolha — pensar no meu bem viver — fosse apenas uma espécie de recompensa por todos os outros sacrifícios que, estes sim, eu faço.
Afinal, sou ocidental, nascida e criada no colo da sociedade patriarcal, na cultura judaico-cristã, as you know, que valoriza a dor, o sofrimento e a penitência. Do alto dos meus privilégios de mulher branca, hetero, classe média, fui ensinada a acreditar na redenção somente após a cruz; a celebrar a resistência e desconhecer a compaixão.
Pois que a minha Lua — gosto de chamar a menstruação de Lua (mim deixa) — chegou uns dias antes do que eu imaginava. E a única coisa que eu pensei na hora foi: porra, corpo, ainda não dá pra desacelerar! Eu me debati com o pedido de contração do meu ser, porque havia muito a ser feito. E eu fiz. Ser uma mulher adulta é também honrar compromissos e sustentar escolhas. Mas ontem, em especial, foi um dia “low battery”, quando o corpo manda toda hora notícia de que está precisando recarregar.
Atendi essa necessidade na medida do possível e o possível foi pouco. Demorei 3 vezes mais para realizar cada atividade e pedi pra mente tirar energia criativa do reservatório de emergência. Fiz o melhor que pude, consciente de que meu teto de entrega estava baixo ou pelo menos aquém do que a usual expectativa de alta performance esperaria de mim. Atravessei o dia com uma sensação velha conhecida. Aquela que vem, sorrateira, mover a confiança para o pântano da fraude. Senti no corpo: é hoje. É hoje que vão descobrir a minha farsa. Hoje minha pretensão será revelada, minhas insuficiências expostas. Finalmente, serei mandada pro meu lugar.
Era dia de abertura de um novo e profundo projeto de trabalho - a Mentoria TEMPO PRA MIM (óh, deusas da ironia!). Era hora da TPM existir de fato, sair da minha cabeça e atravessar o olhar e a experiência do outro. Era dia de ver a carinha do rebento, sentir o cheirinho do vérnix, ouvir o choro, entender quereres. Também era hora da morte. Instante em que as idealizações terminam e resta a experiência pura, sem mistificação. Hora de abrir as cortinas, sentir a tensão, seguir o feeling, abrir o campo, tangenciar a força do que é.
Desejei demais esse momento, imaginei a experiência, e na hora estive presente com cada um dos meus poros — mesmo drenando energia em sangue, cansaço e pedido de cama. Entretanto, não me senti desrespeitada. Fiz uma escolha consciente por honrar o pulso da minha fome de vida.
Chegar na TPM acompanhada da minha Lua foi importante e simbólico. Deu medo e, por isso, exercitei coragem. Enfrentei a trilha. No fim do dia, me permiti massagem e silêncio para aceitar a imperfeição e enterrar as certezas. Precisei de uma noite de sono pra lembrar que não realizamos sonhos sem olhar pro céu.
Um beijo!
Dani Moraes
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