#26 – História de boca
Já cantei, já chorei, já deixei chorar, mas o que mais fiz nas minhas noites nos últimos 10 anos foi contar histórias. Desde que a minha filha mais velha nasceu, conto histórias para ela antes de dormir. Assim, a literatura infantil virou um encantamento. Os livros se tornaram um convite para que eu também acessasse sentimentos de maneira profunda. Aprendo sobre medo, solidão, amor e ciúme. Me conecto com a minha criança interior, tantas vezes assustada e insegura, e dou um colinho para ela - livre para me emocionar com a narrativa, com a magia das ilustrações e testemunhar a capacidade das pequenas de se entregarem à fantasia.
As histórias que as minhas filhas mais gostam que eu conte são as "histórias de boca". Quase sempre pedem pelas histórias da minha infância. Pronto. Tenho aí uma nova oportunidade de reviver aventuras, lembrar de sonhos e fazer um cafuné na minha menina de 7 anos.
Nessa hora, aparece quase sempre uma personagem importante: tia Neise. Ela está em quase todas as minhas melhores e mais divertidas histórias. As meninas aqui já sabem e comemoram: oba, mais uma história com a tia Neise! Entre as que eu mais gosto de contar estão as de quando ela me levava ao teatro.
Esse era o meu passeio favorito. Lembro de assistir peças incríveis no Procópio Ferreira, no Ruth Escobar e no Maria Della Costa. A gente se emperequetava toda! Era um evento importante e nunca podia faltar: pipoca e uma caixa de Mentex. Como eu adorava sentir o gostinho daquela bala branca que ia ficando transparente e grudenta.
Lembro de ver Rapunzel e Pinóquio, mas também assistia peças de adulto! Vi "A Partilha", com Susana Vieira, Arlete Salles, Natália do Vale e Thereza Piffer; “Elas por Ela”, com Marília Pêra; o Mistério de Irma Vap, com Ney Latorraca e Marco Nanini; e até "Trair e coçar é só começar", com a diva Denise Fraga. Ah! Vi também "Sonho de uma Noite de Verão", com o Cacá Rosset - me fingindo blasé nas cenas de nudez.
A lembrança mais doce e viva que tenho destes dias volta à memória quase todas as vezes em que me sento numa plateia. Ela remonta à minha tia explicando o significado dos três sinais. "O primeiro toque nos alerta que faltam 10 minutos; o segundo, que faltam 5; e ao ouvirmos os três sinais sabemos que a peça vai começar", ela dizia.
É quando tudo se apaga, quando um arrepio de emoção corre a espinha, o coração acelera e a gente se prepara para aquele momento único. Era como se a magia de certa maneira estivesse ali acontecendo só para mim. E, de fato, vista daquele ponto, do meu ponto de vista, era mesmo irreplicável.
De tudo que deixamos de viver e fazer nos últimos tempos, ouvir o terceiro sinal está entre aquilo de que mais sinto falta (só perde para a dilacerante impossibilidade dos abraços). Se pudesse fazer um pedido hoje, algo simples e redentor, desejaria o teatro e uma caixa inteira de Mentex.
Um grande beijo!
Dani
#Caminhantes2021
"A criatividade é uma força natural que todos vivenciamos de uma forma ou de outra”. Essa frase é de Julia Cameron, a autora do livro “O Caminho do Artista”, que já teve mais de 5 milhões de cópias vendidas em todo o mundo e propõe reflexões e atividades - a serem lidas e realizadas durante 12 semanas. O objetivo? **Recuperar a potência** criativa que existe em qualquer pessoa.
Em maio, começa a segunda turma da minha guiança do livro e as inscrições para essa jornada estão abertas. O grupo está ficando lindo e, se você sentir vontade de saber mais e participar, é só clicar aqui: https://www.sympla.com.br/caminhantes-2021---turma-2---maiojulho-online__1121129